Susana Durão, Maria Cláudia Coelho
Revista Sociedade e Estado, vol. 29 (3) Set/Dez, pp: 921-940.
Publication year: 2014

Resumo

Este trabalho analisa a cobertura midiática do assassinato de Evandro João da Silva, um dos “líderes” do Grupo Cultural AfroReggae (GCAR), ocorrido no Centro do Rio de Janeiro, em outubro de 2009, em consequência de reação a um assalto. A análise baseia-se na interpretação de que as propostas de intervenção social do GCAR constituem um “projeto moral” ancorado na noção de responsabilidade para com o outro. Este projeto seria desenvolvido, no plano discursivo, através de pequenos “contos morais”, que têm como protagonista o sobrevivente, cuja marca emocional é a esperança. Porém, a morte de Evandro insere um dado novo nestes contos: seu protagonista é um mártir, associado não à esperança, mas à utopia. Tomamos este escândalo de opinião pública como um drama social, um momento em que a “sociedade” (neste caso a carioca) discute a si mesma, ou, dito de outro modo, como um ritual, nos termos de Geertz (1978), uma “história que a sociedade conta sobre ela mesma para si mesma”. Qual seria então a “moral” desta história que coloca o GCAR diante de um desafio: lidar com a emergência de um mártir em suas fileiras de sobreviventes? O material analisado é a cobertura do evento no jornal O Globo, no período de 19 a 24 de outubro de 2009. O foco da análise está nas representações da instituição policial presentes nas falas dos diversos atores sociais participantes do debate: autoridades, especialistas, membros do grupo e leitores do jornal.